“Fulano está com depressão e quer se encostar.”
“Ele não tem nada, está só inventando para não trabalhar.”
– Frases como essas não são apenas comentários insensíveis; elas revelam uma realidade cruel: o preconceito social e institucional enfrentado por pessoas que sofrem com transtornos mentais, dependência química ou doenças invisíveis e que, ao buscar amparo no INSS, encontram portas fechadas.
Enquanto a ciência avança no reconhecimento da saúde mental como fator essencial para a dignidade humana, parte do sistema previdenciário brasileiro ainda parece preso a uma lógica ultrapassada: se não aparece no exame de sangue, não é doença. Se não há fratura exposta, não há incapacidade.
Transtornos como depressão (CID F32), ansiedade (CID F41), síndrome do pânico, transtorno bipolar, borderline, estresse pós-traumático, burnout, entre outros, exigem tratamento psiquiátrico contínuo e, em muitos casos, provocam limitações severas à vida profissional, familiar e social. Ainda assim, são tratados com desconfiança nas perícias do INSS.
A situação se agrava no caso de pessoas com dependência química, que enfrentam o estigma do vício e, frequentemente, a negação da própria condição clínica como doença. A Organização Mundial da Saúde, no entanto, é clara: trata-se de uma enfermidade crônica, que requer tratamento e apoio contínuo; inclusive previdenciário ou assistencial, quando há incapacidade ou vulnerabilidade.
A perícia médica no INSS, no entanto, muitas vezes não acompanha essa compreensão. Em atendimentos que duram poucos minutos, conduzidos por profissionais que nem sempre são especialistas na área psiquiátrica, laudos médicos completos, receitas e até registros de internação são tratados como “opiniões subjetivas”.
O resultado? Benefícios negados a quem mais precisa, enquanto a dor emocional é agravada pelo sentimento de invisibilidade e injustiça.
É preciso denunciar: o INSS ainda falha gravemente ao lidar com doenças que não sangram, não inchem e não aparecem no raio-X.
E essa falha não é apenas técnica. É institucional, estrutural e, acima de tudo, humana. Ela marginaliza quem já está fragilizado e perpetua uma lógica desumana de negação de direitos.
O caminho é difícil, mas existe. Pessoas que passam por essa situação devem buscar laudos bem fundamentados, que descrevam em detalhes as limitações diárias, o impacto na vida funcional e o histórico de tratamento. Vídeos, registros de internações e receitas médicas também ajudam. Se houver negativa, é fundamental recorrer administrativamente e, se necessário, judicializar a demanda.
A dignidade da pessoa humana, princípio basilar da Constituição, não pode ser ignorada por um sistema que deveria proteger justamente os mais vulneráveis.
Enquanto isso, seguimos com a pergunta incômoda: até quando o sofrimento invisível continuará sendo tratado como fingimento?
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Por: Dra. Ingrid Dialhane – Advogada Previdenciária.
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