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‘O coração tenta, mas não acompanha’: aos 75 anos, mulher enfrentou 42 internações por arritmia e insuficiência cardíaca

por Redação


Relógio inteligente pode identificar a fibrilação arterial
A aposentada Nair Souto, de 75 anos, aprendeu a reconhecer cada sinal do corpo. Quando o coração dispara, a respiração encurta ou a tontura aparece de repente, ela já sabe o que vem a seguir: a corrida para o pronto-socorro. Desde 2020, foram 42 internações — dias, madrugadas e feriados marcados por emergências cardíacas.
“Já entrei de pijama na emergência. Às vezes o SAMU demora, então a gente vai por conta própria. Eles já me conhecem”, diz Nair.
O primeiro infarto veio há mais de 20 anos, aos 54, quando ela precisou colocar um stent — uma pequena malha metálica usada para desobstruir artérias e restabelecer o fluxo de sangue para o coração.
Depois de um longo período estável, um novo episódio, em 2020, mudou o rumo da história: infarto agudo do miocárdio, seguido do diagnóstico de fibrilação atrial e insuficiência cardíaca. Em julho de 2025, Nair teve um terceiro infarto.
A aposentada Nair Souto, de 75 anos
Arquivo Pessoal
“Quando o coração acelera, sinto o corpo inteiro tremer. A pressão sobe, vem enjoo e falta de ar. É emergência na certa”, resume.
A vida entre picos e pausas
Os batimentos de Nair oscilam entre extremos: às vezes passam de 150 por minuto, às vezes caem para 40. “É quando o corpo cansa e tudo fica lento. Sinto que o coração tenta, mas não acompanha”, conta.
Mesmo assim, ela não abre mão da rotina. Mora em Guarulhos, na Grande São Paulo, cuida da casa, faz crochê, frequenta a igreja, vai à feira e cuida do marido, que viveu o rompimento de dois aneurismas. “Não gosto de deitar durante o dia. A luz é pra viver, não pra ficar parada”, diz.
A filha, que a acompanha em cada internação, aprendeu a administrar as medicações. “Já tivemos noites em claro e dias em UTI, mas também muitas altas que pareciam improváveis”, conta.
O que acontece no coração
Cirurgião cardiovascular do Hospital Beneficência Portuguesa, Ricardo Katoyese é medico de Nair. Ele explica ao g1 que o quadro da aposentada é resultado de um conjunto de alterações que afetam o funcionamento das câmaras cardíacas.
O ponto de partida é uma doença na válvula mitral, estrutura que controla a passagem do sangue entre o átrio e o ventrículo esquerdos.
“Quando a válvula mitral não fecha completamente, parte do sangue que deveria seguir para o corpo volta para o átrio esquerdo. Esse refluxo faz o átrio dilatar com o tempo — e a cavidade dilatada se torna um ambiente propício para o surgimento de arritmias, especialmente a fibrilação atrial”, explica o médico.
A fibrilação atrial (FA) ocorre quando o átrio perde a capacidade de contrair de forma coordenada. Em vez de bombear o sangue, ele apenas vibra — uma contração desorganizada que interrompe o ritmo normal do coração.
“Essa descompensação faz com que o enchimento do ventrículo seja incompleto. O coração continua batendo, mas bombeia menos sangue a cada ciclo. O paciente sente cansaço, falta de ar, palpitação e, às vezes, tontura”, detalha Katoyese.
Além da queda no desempenho cardíaco, a fibrilação atrial traz outro risco importante: a formação de coágulos dentro do átrio.
“Quando o sangue não circula adequadamente, ele tende a se acumular. Com o tempo, pode se coagular e formar pequenos trombos. Se um desses coágulos se desprender, ele pode seguir pela corrente sanguínea e atingir o cérebro, provocando um acidente vascular cerebral (AVC)”, afirma.
Por isso, pacientes com fibrilação atrial — como Nair — precisam de anticoagulantes contínuos para reduzir o risco de trombose, além de acompanhamento frequente para ajustar doses e monitorar os efeitos da medicação.
Outro ponto fundamental é o controle da frequência cardíaca, que precisa se manter em uma faixa segura para que o coração funcione com eficiência.
“Se o batimento está muito rápido, o ventrículo não tem tempo de se encher completamente; se está muito lento, o sangue não circula adequadamente. O equilíbrio entre essas duas condições é o que mantém o paciente funcional e evita novas descompensações”, explica o especialista.
Tratamentos e acompanhamento
O tratamento da fibrilação atrial depende da causa e da gravidade do quadro. Em alguns casos, o controle é feito apenas com medicamentos que reduzem a frequência dos batimentos e estabilizam o ritmo.
Em outros, são necessários procedimentos mais invasivos, como a ablação por cateter — uma técnica que utiliza ondas de radiofrequência ou calor para interromper os focos elétricos anormais que causam a arritmia e restaurar o ritmo normal do coração.
Quando há episódios de bradicardia — ritmo muito lento — ou bloqueios na condução elétrica do coração, o implante de marcapasso pode ser indicado para regular os batimentos e garantir estabilidade.
“Nos casos em que há doença valvar, o foco é tratar as consequências da válvula e evitar a progressão da insuficiência cardíaca. O acompanhamento multidisciplinar, com cardiologista, cirurgião e equipe de reabilitação. É o que define o prognóstico”, diz Katoyese.
Além das intervenções médicas, o estilo de vida influencia diretamente no controle da doença.
“Manter o uso correto dos remédios, controlar o sal, praticar atividade física leve e monitorar a pressão são medidas que fazem diferença na sobrevida. O coração precisa de ritmo — e o cuidado diário é parte dele”, completa o médico.
Fibrilação atrial em números
A fibrilação atrial é a arritmia sustentada mais comum no mundo. Segundo a Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC), ela afeta cerca de 2 milhões de brasileiros e está associada a 1 em cada 3 acidentes vasculares cerebrais isquêmicos.
Estudos internacionais estimam que a prevalência da FA aumenta com a idade: menos de 1% entre pessoas com menos de 60 anos, e até 10% entre idosos acima de 75 anos — faixa etária em que está Nair.
A insuficiência cardíaca, condição frequentemente associada à fibrilação atrial, também preocupa: dados do Ministério da Saúde apontam mais de 220 mil internações por ano no Sistema Único de Saúde (SUS) e quase 30 mil mortes anuais.
“Essas doenças andam juntas. O coração tenta se adaptar, mas, se o paciente não for monitorado, o risco de internações e de mortalidade aumenta muito”, alerta Katoyese.

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