O anúncio foi feito pelo secretário de Finanças do país, Pablo Quirno, em publicação no X. Segundo ele, o Tesouro Nacional vai atuar diretamente na compra e venda de dólares para garantir que haja oferta suficiente e evitar movimentos bruscos de desvalorização.
“O Tesouro Nacional anuncia que, a partir da presente data, participará do mercado livre de câmbio com o objetivo de contribuir para sua liquidez e bom funcionamento”, escreveu Quirno.
- 🔎 Quando entram mais dólares no país — seja por compras do Tesouro, exportações ou investimentos — a oferta da moeda aumenta. Com mais dólares disponíveis, o valor tende a cair em relação ao peso, tornando o dólar mais barato.
Como mostrou o g1, em novembro do ano passado o peso argentino ultrapassou, pela primeira vez na história, a marca de 1.000 por dólar. A depreciação da moeda argentina foi resultado de uma desvalorização controlada pelo banco central do país.
A medida permitia um enfraquecimento do peso em 2% ao mês, em uma estratégia conhecida como “crawling peg”. Em outras palavras, o processo estabelecia que, a cada mês, fossem necessários mais pesos para adquirir US$ 1.
Já em abril deste ano, o governo argentino anunciou a redução dos controles cambiais, o chamado “cepo”. Na prática, a medida determinou o fim da paridade fixa para a moeda argentina e introduziu o “câmbio flutuante” — quando o valor da moeda é determinado pela oferta e demanda do mercado.
Para o economista-chefe da Análise Econômica, André Galhardo, o governo Milei até poderia ter garantido algum fôlego no curto e médio prazo ao flexibilizar parte das restrições cambiais. Porém, fatores econômicos e políticos — incluindo o desgaste da imagem do presidente — pioraram o quadro.
A gestão Milei está preocupada com as eleições provinciais do próximo domingo (7) — entre elas a mais importante, em Buenos Aires — e com o pleito legislativo de meio de mandato, marcado para 26 de outubro.
“Existem componentes políticos e econômicos que explicam a desvalorização do peso”, diz Galhardo. “Embora o momento atual seja melhor para a economia, a Argentina ainda tem problemas estruturais. E isso não se corrige do dia para a noite.”
“A Argentina tem um pouco mais de reservas internacionais [do que antes] e acordos mais sólidos com o FMI, mas os problemas que minaram as reservas do país estão presentes. Então, é a Argentina se reencontrando com ela mesma”, acrescenta.
Em maio, Milei passou a incentivar os argentinos a usar os dólares guardados “debaixo do colchão”. O governo lançou um plano que permite aplicar economias não declaradas na compra de imóveis de até US$ 43 mil ou em depósitos a prazo fixo de até US$ 85 mil nos bancos, sem necessidade de justificar a origem do dinheiro.
A medida tinha como objetivo injetar recursos na economia — mas não foi suficiente para conter a desvalorização do peso.
Segundo Galhardo, da Análise Econômica, a decisão de intervir no câmbio anunciada nesta terça-feira pode prejudicar a percepção dos investidores sobre a economia do país.
“Por outro lado, há uma interpretação de que o governo argentino entendeu que é preciso colocar o pé no chão e empreender medidas em um ritmo adequado e sem precipitações”, conclui.
O presidente da Argentina, Javier Milei, faz um discurso especial durante a 55ª reunião anual do Fórum Econômico Mundial em Davos, Suíça, em 23 de janeiro de 2025. — Foto: Reuters
Crise política
Um escândalo de áudios vazados, acusações de corrupção e divisões internas atinge a cúpula do governo argentino há duas semanas — e já respinga no presidente Javier Milei.
Braço direito do irmão, Karina Milei é secretária-geral da Presidência na Argentina. Segundo denúncia de Diego Spagnuolo, ex-chefe da Agência Nacional para a Deficiência (Andis) — demitido um dia após a divulgação do caso —, ela e o subsecretário de gestão institucional do governo, Eduardo ‘Lule’ Menem, estariam cobrando propina de indústrias farmacêuticas para a compra de medicamentos da rede pública.
“Estão roubando. Você pode fingir que não sabe, mas não joguem esse problema para mim, tenho todos os WhatsApp de Karina”, acusa Spagnuolo.
“Tudo o que ele diz é mentira, vamos levá-lo à Justiça e provar que mentiu”, afirmou.
A polêmica tem potencial de impactar a governabilidade de Milei porque expõe o presidente a duas semanas das eleições para a província de Buenos Aires e quase dois meses das eleições legislativas na Argentina. Além disso, abala a confiança dos investidores.
Os índices de aprovação de Milei, que já vinham caindo nas últimas semanas, tiveram uma queda ainda maior devido às suspeitas envolvendo a alta cúpula de seu governo.
Presidente argentino, Javier Milei, e sua irmã Karina Milei. — Foto: Gustavo Garello/ AP Photo