Índice
No Irã, o regime dos aiatolás procurou controlar a narrativa interna e afirmou que o ataque iraniano a uma base militar dos EUA no Catar teria contribuído para que o cessar-fogo fosse “imposto ao inimigo sionista”.
No entanto, tudo indica que o ataque à base no Catar foi cuidadosamente calibrado para manter as aparências:
- forte o suficiente para virar manchete e servir de propaganda interna ao regime em Teerã; e
- fraco o suficiente para não causar danos nem ao Catar nem aos EUA — o Irã, afinal, notificou os EUA com antecedência sobre a ofensiva.
No mercado financeiro, o ataque à base americana no Catar não provocou pânico — pelo contrário, gerou alívio, e os preços do petróleo caíram significativamente na noite de segunda-feira.
Isso ocorreu apesar de o Irã deter um trunfo estratégico: o Estreito de Ormuz, por onde passam cerca de 20 milhões de barris diários de petróleo bruto, condensado e derivados. Um bloqueio dessa rota teria grande impacto na economia global.
Mas um bloqueio realmente beneficiaria o Irã?
Segundo a EIA, agência de informação energética dos EUA, a economia iraniana é relativamente diversificada em comparação com outros países do Oriente Médio. No entanto, sua indústria é voltada principalmente para o consumo interno.
Por isso, as exportações de petróleo e seus derivados são uma fonte essencial de divisas e receita para o governo, representando mais de 17% do total exportado — sendo o gás responsável por quase 12%.
Em 2023, o Irã foi o quarto maior produtor de petróleo bruto da Opep e, em 2022, o terceiro maior produtor de gás natural seco (aquele com baixa presença de gases de condensação rápida, como o hidrogênio), segundo a EIA.
Estreito de Ormuz — Foto: Arte/g1
Exportações apesar das sanções
Apesar de estar sob sanções internacionais há muitos anos, o regime iraniano continua exportando petróleo. Quem mais lucrou com isso foi a China. Em 2023, quase 90% das exportações iranianas tiveram como destino o país asiático.
Segundo o ministro do Petróleo, Javad Owji, citado pelo jornal britânico “Financial Times”, o Irã exportou mais de US$ 35 bilhões em petróleo em 2023. Nesse ano, o setor representou mais de 8% do PIB.
Em 2024, os volumes exportados cresceram ainda mais, conforme estimativas baseadas em dados da empresa de análise Vortexa.
Bloquear o Estreito de Ormuz teria, portanto, causado prejuízos ao próprio Irã, afetando sua receita com a venda de petróleo. Além disso, poderia gerar atritos com seu principal parceiro comercial, a China, que se beneficia do petróleo barato iraniano.
A emissora Iran International, sediada em Londres, estima que o Irã oferece seu petróleo com um desconto de 20% em relação ao preço de mercado, já que o comprador assume os riscos associados às sanções dos EUA.
“As refinarias chinesas são as principais compradoras dos embarques ilegais de petróleo do Irã, que são misturados por intermediários com fornecimentos de outros países e declarados na China como importações de Singapura ou de outros locais”, informou a emissora.
De acordo com a Rystad Energy, empresa norueguesa de pesquisa em energia, a China importa cerca de 11 milhões de barris de petróleo bruto por dia. Aproximadamente 10% desse volume vêm do Irã.
Bloqueio teria ainda afetado países vizinhos
Um bloqueio do Estreito de Ormuz poderia ainda gerar tensões com países vizinhos. Kuwait, Iraque e Emirados Árabes Unidos também transportam seu petróleo por essa passagem.
Se fechasse o estreito, Teerã “minaria as alianças que ainda restam com os Estados da região”, avalia o economista, Justin Alexander, especialista em Golfo Pérsico.
Resta a dúvida sobre quanto tempo o Irã conseguiria sustentar um bloqueio. Segundo o analista Homayoun Falakshahi, da empresa de análise Kpler, em entrevista ao site alemão Tagesschau, uma ação desse tipo poderia provocar uma resposta militar rápida e contundente dos EUA e de países europeus.
Ele estima que o Irã conseguiria manter o Estreito de Ormuz fechado por, no máximo, dois dias.
Sanções e inflação
Um novo agravamento da crise econômica também seria mal recebido pela população iraniana. De acordo com o economista Djavad Salehi-Isfahani, professor da universidade americana Virginia Tech, as sanções fizeram com que o padrão de vida no país retrocedesse ao nível de duas décadas atrás.
As sanções afetam não apenas a indústria petrolífera, mas também os pagamentos internacionais ao Irã, o que tem alimentado a inflação. Desde o início do ano, os preços subiram significativamente, com a taxa inflacionária ultrapassando 38,7% em maio de 2025, em comparação com o mesmo mês de 2024.
A combinação entre sanções e desvalorização da moeda tem tornado o custo de vida no país cada vez mais elevado.
Estreito de Ormuz: Como isso afeta o Brasil?