Início » Entenda por que GM, VW, Toyota e Stellantis pressionam o governo contra a BYD

Entenda por que GM, VW, Toyota e Stellantis pressionam o governo contra a BYD

por Redação
entenda-por-que-gm,-vw,-toyota-e-stellantis-pressionam-o-governo-contra-a-byd

No centro da discussão estava um pedido da chinesa BYD para que o governo reduzisse o imposto de importação sobre carros trazidos do exterior em estado semi-pronto, para serem montados no país.

Em fevereiro, a montadora propôs uma alíquota de 10% para veículos elétricos que chegassem parcialmente montados (SKD) e de 5% para modelos ainda mais desmontados (CKD). (entenda os termos abaixo)

Foi com modelos semi-acabados que a BYD iniciou, em julho, a operação de sua fábrica em Camaçari, na Bahia. A empresa defendia a redução do imposto, alegando que a atividade já gerou investimentos e empregos no país.

A decisão caberia ao Comitê Executivo de Gestão da Câmara de Comércio Exterior (Gecex-Camex).

Diante da possibilidade de favorecimento à BYD, quatro das principais montadoras em atividade no Brasil se uniram para pressionar o governo.

Volkswagen, Stellantis, GM e Toyota assinaram uma carta conjunta, endereçada ao presidente Lula, pedindo que a isenção do imposto não fosse concedida. (leia a íntegra abaixo)

“Por uma questão de isonomia e busca de competitividade, essa prática deletéria pode disseminar-se em toda a indústria, afetando diretamente a demanda de autopeças e de mão de obra”, diz a carta assinada pelos presidentes das quatro empresas.

“Seria uma forte involução, que em nada contribuiria para o nível tecnológico de nossa indústria, para a inovação ou para a engenharia nacional. Representaria, na verdade, um legado de desemprego, desequilíbrio da balança comercial e dependência tecnológica.”

A BYD também respondeu com uma carta. A empresa chinesa afirmou que sua chegada ao Brasil provocou uma reação negativa das montadoras tradicionais, e sugeriu que a real preocupação dessas empresas é perder a posição dominante no mercado e não conseguir competir com os preços e a tecnologia da marca. (leia a íntegra abaixo)

“A reação da Anfavea [associação dos fabricantes] e seus associados, infelizmente, não é novidade. Trata-se do velho roteiro de sempre: diante de qualquer sinal de abertura de mercado ou inovação, surgem as ameaças de demissões em massa, fechamento de fábricas e o fim do mundo como conhecemos”, diz a BYD.

“É uma espécie de chantagem emocional com verniz corporativo, repetida há décadas pelos barões da indústria para proteger um modelo de negócio que deixou o consumidor brasileiro como último da fila da modernidade.”

A pressão das montadoras tradicionais surtiu algum efeito. A decisão do governo, publicada no Diário Oficial na última quinta-feira (31), buscou um meio-termo: atendeu aos interesses das montadoras, mas sem descartar totalmente os pedidos da BYD.

O governo atendeu aos fabricantes já instalados no Brasil rejeitando a proposta de alíquota reduzida da BYD e antecipando em um ano e meio o cronograma de retomada gradual do imposto de importação.

Os percentuais estavam previstos para subir de forma gradual até julho de 2028, quando todos os modelos importados — elétricos e híbridos — atingiriam a alíquota de 35%. O novo prazo é janeiro de 2027.

No entanto, para não deixar a BYD completamente desassistida, o governo zerou, por um período de seis meses, o imposto de importação para veículos elétricos e híbridos que chegarem ao país desmontados ou semimontados. (veja detalhes abaixo)

O g1 procurou Volkswagen, Stellantis, GM, Toyota e BYD para comentar o desfecho da história, mas nenhuma delas concedeu entrevista.

A fúria contra os chineses

A entrada em massa de veículos importados no Brasil é uma reclamação antiga da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea).

No primeiro semestre de 2025, o número de veículos importados emplacados no Brasil cresceu 15,6%, passando de 197.667 nos primeiros seis meses do ano passado, para 228.472 unidades neste ano.

A Argentina segue como o principal fornecedor de veículos de fora, mas a China registrou o maior crescimento no período: alta de 37,2%, com 70.695 unidades emplacadas.

A Anfavea projeta que, até o fim de 2025, a China será responsável por cerca de 200 mil veículos importados emplacados no Brasil.

A BYD é a principal responsável por essa entrada expressiva no mercado brasileiro. Em 2024, o país já era o maior mercado internacional da montadora, absorvendo quase 20% de suas exportações globais.

Neste ano, a marca ocupa a oitava posição no ranking nacional de vendas, encostada na Honda e à frente de Renault e Nissan. A montadora aposta em ganhar mais posições quando sua produção for nacionalizada — reduzindo impostos e potencialmente o preço final dos veículos.

Ao todo, mais de 11 marcas chinesas já atuam no Brasil em 2025, incluindo nomes como Omoda, Jaecoo, Zeekr, Neta e Geely.

A projeção é que, até o fim do ano, o número chegue a 13 marcas em operação, com a entrada de Leapmotor (pelas mãos da Stellantis, grupo que controla marcas como Fiat, Jeep e Peugeot) e SAIC.

Quem opta por investir em uma fábrica no país geralmente começa com veículos semimontados. O modelo SKD é o que exige menos mão de obra local, já que os carros chegam quase prontos.

Uma das principais vantagens desse esquema é aproveitar a mão de obra estrangeira e o desenvolvimento de tecnologias específicas para componentes que ainda não são produzidos no Brasil.

Como são montados os carros com partes importadas — Foto: Arte/g1

É aí que está o ponto da polêmica entre a BYD e a Anfavea. A montadora chinesa entende que os modelos semimontados já caracterizam uma forma de produção em solo nacional e, por isso, defendia a redução do imposto.

A Anfavea é contrária à ideia, pois suas montadoras associadas realizam toda a produção dentro do Brasil.

Segundo a carta enviada pelas montadoras, o setor automotivo representa 2,5% do Produto Interno Bruto (PIB) do país, responde por 20% do PIB da indústria de transformação e gera cerca de 1,3 milhão de empregos.

As montadoras também ressaltam os investimentos anunciados no ano passado para o Brasil, que somam cerca de R$ 180 bilhões. Os recursos serão destinados à modernização de fábricas, lançamento de novos modelos e renovação da cadeia de autopeças.

Na contramão das montadoras chinesas, a Anfavea chegou a pedir a elevação imediata — ou ao menos a antecipação — da alíquota máxima de 35% para carros híbridos e elétricos importados.

A decisão da Gecex-Camex representa um meio-termo.

  • Os kits CKD pagavam imposto de 10% a 14% para veículos elétricos (BEV) e 14% para híbridos (HEV/PHEV), com validade até julho de 2028.
  • Os kits SKD não contavam com proteção tarifária, e os veículos montados estavam sujeitos à alíquota máxima a partir de julho de 2026.

Na nova resolução publicada nesta semana, o benefício das alíquotas reduzidas para CKD termina antecipadamente em janeiro de 2027, quando o imposto passará a ser de 35%.

Também foram instituídas cotas temporárias de importação — no valor de US$ 463 milhões para kits CKD e SKD — permitindo a entrada desses veículos com imposto zero até janeiro de 2026 ou até que a cota seja esgotada.

Esse volume permite a importação de cerca de 45 a 50 mil veículos apenas em 2025.

“É um número bastante significativo, considerando a projeção de vendas totais de veículos eletrificados para 2025, que gira em torno de 255 mil unidades”, afirma Cassio Pagliarini, diretor de estratégia da Bright Consulting.

Após esse período, voltam a vigorar as alíquotas cheias, e passa a valer a exigência de 55% de conteúdo local para acesso às tarifas permanentes mais baixas, que variam entre 16% e 18% sobre os kits.

Veja a carta das montadoras

Excelentíssimo Senhor Presidente Lula,

Com nossos cumprimentos, vimos expor o teor de nossas preocupações quanto ao futuro da indústria automotiva brasileira.

O setor tem sido, desde os anos 1950, um importante vetor de industrialização e de crescimento econômico para o Brasil. Nasceu de uma visão desenvolvimentista, impulsionando com sua expansão um dos maiores e mais diversificados parques mundiais de fabricantes de veículos e autopeças.

A cadeia produtiva automotiva exibe números consistentes, que atestam o acerto da estratégia de localização da produção de veículos e seus componentes. São 26 fabricantes de veículos instalados no país e 508 produtores de autopeças, que formam uma cadeia produtiva responsável por 2,5% do PIB brasileiro, 20% do PIB industrial de transformação, pela geração de 1,3 milhão de empregos e por um faturamento anual de US$ 74,7 bilhões.

Nossa indústria planeja investir R$ 180 bilhões nos próximos anos, sendo R$ 130 bilhões no desenvolvimento e produção de veículos e outros R$ 50 bilhões no parque de autopeças.

Essa sólida cadeia industrial consolidou-se ao longo de mais de 70 anos de presença no Brasil. Sucessivas ondas de investimentos no decorrer desse período histórico enraizaram profundamente a capacidade industrial, tecnológica e de desenvolvimento de produtos e engenharia de nosso setor, impactando positivamente a economia e a sociedade. A industrialização urbanizou o país, expandiu o mercado de trabalho, impulsionou a educação e a ciência, somou desenvolvimento econômico ao social. Além de resultar em uma base industrial como poucas no mundo, propiciou a consolidação da engenharia nacional.

É nosso dever alertar, Senhor Presidente, que esse ciclo virtuoso de fortalecimento da indústria nacional está sendo colocado em risco e sofrerá forte abalo se for aprovado o incentivo à importação de veículos desmontados para serem acabados no país.

Ao contrário do que querem fazer crer, a importação de conjuntos de partes e peças não será uma etapa de transição para um novo modelo de industrialização, mas representará um padrão operacional que tenderá a se consolidar e prevalecer, reduzindo a abrangência do processo produtivo nacional e, consequentemente, o valor agregado e o nível de geração de empregos.

Por uma questão de isonomia e busca de competitividade, essa prática deletéria pode disseminar-se em toda a indústria, afetando diretamente a demanda de autopeças e de mão de obra. Seria uma forte involução, que em nada contribuiria para o nível tecnológico de nossa indústria, para a inovação ou para a engenharia nacional. Representaria, na verdade, um legado de desemprego, desequilíbrio da balança comercial e dependência tecnológica.

Trazemos nossos argumentos à sua análise, Senhor Presidente, na expectativa de que seu governo assegure igualdade de condições na competição pelo mercado, vetando privilégios para a importação de veículos desmontados ou produzidos no exterior com subsídios. Confiamos na sensibilidade de Vossa Excelência para preservar a isonomia concorrencial e proteger a indústria que produz no Brasil.

Nossos investimentos em curso resultarão em novas plantas industriais, em mais empregos, valor agregado e em uma nova geração de veículos cada vez mais sustentáveis. Reafirmamos, desse modo concreto, nosso compromisso com o fortalecimento da indústria nacional e com o desenvolvimento econômico e social do Brasil.

Ciro Possobom Volkswagen do Brasil
Evandro Luiz Maggio Toyota do Brasil
Emanuelle Cappellano Stellantis Automóveis do Brasil
Santiago Chamorro General Motors do Brasil

Veja a da carta da BYD

Por que a BYD incomoda tanto?

Empresa que trouxe carros tecnológicos, sustentáveis e mais acessíveis é atacada por concorrentes obsoletos

Dizem que o futuro chega de repente. Mas, às vezes, o que chega de repente é o e-mail. O da vez foi uma carta enviada por quatro das maiores montadoras brasileiras ao Presidente da República, implorando para ele abortar a inovação. É isso mesmo: pedem, com todas as letras, que o governo impeça a redução temporária dos impostos para quem ousa oferecer carros melhores por um preço mais justo.

Assinada por representantes da Toyota, Stellantis, Volkswagen e General Motors, a carta tem o tom dramático de quem acaba de ver um meteoro no céu. O problema não é o meteoro, claro. O problema é que ele está sendo bem recebido pelos consumidores — aqueles mesmos que, por décadas, foram obrigados a pagar caro por tecnologia velha e design preguiçoso.

Agora, chega uma empresa chinesa que acelera fábrica, baixa preço e coloca carro elétrico na garagem da classe média, e os dinossauros surtam. Não foi por acaso que uma concorrente reduziu o valor de um modelo elétrico em mais de 100 mil reais depois da chegada da BYD. Por que antes custava tanto?

A carta fala em “concorrência desleal”. Porque nada é mais desleal do que alguém jogar o jogo — e ganhar. Nada mais injusto do que montar um carro no Brasil sob o regime autorizado pelo governo, com data marcada para nacionalizar a produção, e ainda assim entregar um produto que as “locais” não conseguem nem sonhar em oferecer.

A reação da Anfavea e seus associados, infelizmente, não é novidade. Trata-se do velho roteiro de sempre: diante de qualquer sinal de abertura de mercado ou inovação, surgem as ameaças de demissões em massa, fechamento de fábricas e o fim do mundo como conhecemos. É uma espécie de chantagem emocional com verniz corporativo, repetida há décadas pelos barões da indústria para proteger um modelo de negócio que deixou o consumidor brasileiro como último da fila da modernidade.

A ironia é que enquanto as cartas se empilham em Brasília, os consumidores já tomaram sua decisão. Basta olhar os comentários nas redes sociais da própria Anfavea: “Lutar por carro mais barato vocês não lutam, agora querem nosso apoio pra que?”. Ou ainda: “Sempre vou dizer o seguinte: se a Anfavea está tão incomodada, é porque o outro lado vale a pena”. Os brasileiros querem andar para frente e não seguir em marcha a ré.

A redução temporária de imposto que a BYD pleiteia segue uma lógica simples e razoável: não faz sentido aplicar o mesmo nível de tributação sobre veículos 100% prontos trazidos do exterior e sobre veículos que são montados no Brasil, com geração de empregos locais, movimentação da cadeia logística e pagamento de encargos. Isso não é nenhuma novidade, outras montadoras já adotaram a mesma prática antes de ter a produção completa local.

E a BYD está fazendo isso. Em menos de um ano e meio, já está finalizando a primeira etapa das obras da fábrica em Camaçari (BA), no mesmo local onde outra montadora, que também era tradicional, desistiu do Brasil. Apenas o galpão de montagem final já é mais do que a metade do tamanho da antiga fábrica inteira. E o contrato com o Governo da Bahia já previa essa fase inicial de montagem enquanto o restante da estrutura é finalizado. Nada foi alterado. Tudo dentro do planejamento desde o começo.

O incômodo das concorrentes não tem a ver com impostos, nem com montagem, nem com empregos. Tem a ver com a perda de protagonismo. Com o fato de que um novo player chegou oferecendo mais e cobrando menos. Com o fato de que a tecnologia finalmente deixou de ser um luxo para poucos e virou realidade para muitos.

O que a BYD propõe ao Brasil não é um atalho nem uma esperteza fiscal. É uma visão de futuro com veículos mais limpos, mais seguros, mais conectados e com custo-benefício justo. Ajudar o Brasil a acelerar essa transição é um movimento estratégico não só para a marca, mas para o país.

O Presidente deveria ouvir essas cartas — e usá-las como prova de que está no caminho certo. Porque se os dinossauros estão gritando, é sinal de que o meteoro está funcionando.

você pode gostar

SAIBA QUEM SOMOS

Somos um dos maiores portais de noticias de toda nossa região, estamos focados em levar as melhores noticias até você, para que fique sempre atualizado com os acontecimentos do momento.

CONTATOS

noticias recentes

as mais lidas

Jornal de Minas © Todos direitos reservados à Tv Betim Ltda®