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Como parte de seu plano estratégico, a estatal planeja integrar essa operação com outros negócios no Brasil e no exterior, além de oferecer soluções de baixo carbono aos clientes.
Atualmente, a Petrobras produz o GLP, mas a revenda é feita por distribuidoras privadas. A empresa deixou esse mercado durante o governo Jair Bolsonaro (PL), quando vendeu a operação da Liquigás.
Ainda não está definido se a Petrobras voltará com venda direta ao consumidor — incluindo entrega de botijões — ou se atuará apenas como distribuidora, competindo com empresas privadas que hoje compram o gás da estatal para revenda.
O g1 preparou seis perguntas e respostas para entender os planos da empresa e os possíveis impactos no preço do gás de cozinha.
1. Por que a Petrobras quer voltar ao mercado de distribuição de gás?
Segundo comunicado oficial, a Petrobras busca “atuar em negócios rentáveis e em parcerias nas atividades de distribuição, respeitando as disposições contratuais vigentes”.
A empresa destacou que a inclusão dessa medida em seu Plano Estratégico ainda está em fase inicial, tratada como algo “embrionário” e em estudo.
Em maio, durante a inauguração de uma obra da transposição do Rio São Francisco, na Paraíba, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) fez críticas aos preços do gás.
“A Petrobras manda o gás de cozinha a R$ 37. Quando chega aqui, está a R$ 110, R$ 120, em alguns estados até R$ 140. E eu posso dizer que está errado. Não se pode pagar R$ 140 por algo que custa R$ 37 na Petrobras. É certo que há o custo do transporte, mas não precisa ser tanto”, afirmou.
Para o estrategista Max Bohm, da Nomos Investimentos, a decisão causa preocupação no mercado por ser interpretada como “um passo político, mais do que econômico”.
“A primeira reação é negativa, porque a Petrobras deveria focar em negócios de maior rentabilidade, como o pré-sal. Essa retomada gera receio de que decisões estratégicas da empresa passem a ter peso político, algo que já prejudicou a estatal em gestões anteriores”, disse.
2. Como era a atuação da Petrobras na distribuição de gás antes?
Até 2020, a Petrobras participava da distribuição de gás de cozinha por meio da Liquigás e de combustíveis líquidos pela BR Distribuidora (hoje Vibra).
Na época, o então presidente da Petrobras, Roberto Castello Branco, justificou a venda da Liquigás como parte da estratégia de reduzir dívidas, e concentrar esforços na exploração e produção de petróleo em águas profundas e ultraprofundas.
Mesmo sendo lucrativa, a distribuição de gás gerava retornos mais baixos que a exploração para a Petrobras. A expectativa era que o pré-sal gerasse lucros muito superiores com o mesmo nível de investimento, explica Bruno Benassi, da Monte Bravo.
“A estratégia tinha como objetivo liberar caixa para áreas mais promissoras. Hoje, voltar a esse mercado parece contraditório, já que os fundamentos não mudaram. O que muda é a pressão política para reduzir preços ao consumidor”, disse.
A Liquigás tinha presença em todos os estados, com 23 centros de operação, cerca de 4,8 mil revendedores autorizados e 21,4% de participação no mercado — o que equivalia a um em cada cinco botijões vendidos.
Na época, o mercado considerou o negócio positivo tanto para a Copagaz quanto para a Petrobras, que buscava acelerar seu programa de desinvestimentos e focar na produção de petróleo.
Além disso, a venda da Liquigás integrava o programa de privatizações do governo Bolsonaro, voltado à redução da participação do Estado em empresas públicas.
Botijão de gás — Foto: Reprodução / RBS TV
Eric Gil Dantas, do Instituto Brasileiro de Estudos e Pesquisas Sociais (Ibeps), acredita que os preços podem diminuir. Ele discorda, inclusive, da análise majoritária no mercado de que a distribuição de GLP teria margens mais estreitas.
O especialista cita um estudo da Empresa de Pesquisa Energética (EPE) que revela que, entre 2020 e 2023, as margens líquidas das distribuidoras de gás de cozinha cresceram 188%, bem acima da inflação.
“Com a volta da Petrobras, há espaço para reduzir margens e trazer alívio ao consumidor. Mas isso depende se a estatal vai priorizar resultado financeiro ou bem-estar econômico”, disse.
Por outo lado, Benassi, da Monte Bravo, pondera que é possível reduzir o preço final, mas essa medida impactaria diretamente a rentabilidade da empresa.
“Quanto menor o preço do botijão, menor será a margem da operação. A equação não é simples: reduzir preços pode agradar consumidores, mas compromete o retorno do investimento”, afirma.
Em relatório divulgado logo após o anúncio da Petrobras, analistas do Citi afirmaram que o retorno da empresa ao mercado de GLP é viável, mas deve ocorrer de forma gradual e custosa.
Mas há barreiras contratuais — como a licença da marca BR concedida à Vibra e a cláusula de não concorrência vigente até 2029 —, que limitariam a velocidade com que a Petrobras poderia retomar completamente suas operações no setor de gás de cozinha.
Segundo o Citi, essa iniciativa demandaria um desembolso estimado em US$ 7 bilhões (aproximadamente R$ 38 bilhões), um investimento elevado mesmo para a estatal.
4. Como é formado o preço do botijão de gás?
Atualmente, o preço médio do botijão de 13 kg no Brasil é de R$ 107,49, atingindo R$ 109,97 em São Paulo, segundo levantamento da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) realizado entre 3 e 9 de agosto.
Além do custo de produção, o preço inclui impostos e as margens de lucro da distribuição e revenda. Veja abaixo.
Composição de preços do botijão de gás de 13kg — Foto: Arte/g1
De acordo com dados da ANP, em 2022, quatro empresas concentravam 88,3% do mercado de distribuição de GLP no Brasil.
- A Copa Energia liderava o setor com 23,81% de participação;
- A Ultragaz ocupava a segunda posição, com 22,51%;
- A Nacional Gás era a terceira, com 21,55%;
- e Supergasbras, em quarto lugar, com 21,02%.
5. O que diz o setor de distribuição de GLP?
O anúncio da Petrobras surpreendeu distribuidoras e revendedoras de gás, mas, segundo o Sindicato Nacional das Empresas Distribuidoras de Gás Liquefeito de Petróleo (Sindigás), não representa uma ameaça significativa à concorrência no setor.
“Qualquer novo entrante que se submeta às mesmas regras do mercado é bem-vindo. O período em que a Liquigás fazia parte do setor foi considerado saudável para todos”, afirma o presidente do sindicato, Sérgio Bandeira de Mello.
No entanto, ele acredita que a entrada da Petrobras provavelmente terá impacto limitado sobre a concorrência ou os preços. Segundo Bandeira, a principal forma de reduzir custos é aumentar a eficiência logística, por exemplo:
- otimizar rotas de entrega;
- usar georreferenciamento e telemetria para planejar abastecimentos;
- investir em inovação.
6. Como a entrada da Petrobras pode impactar a competitividade?
Sérgio Bandeira destaca que, apesar da concentração, o setor continua competitivo para novos participantes. “Qualquer novo agente altera a dinâmica do mercado. A disputa é semelhante à de água mineral ou refrigerantes, com forte briga por pontos de venda e espaço”, avalia o analista.
Ilan Arbetman, da Ativa Investimentos, acrescenta que o efeito sobre a competição dependerá do modelo de atuação que a Petrobras escolher.
“Se ela voltar apenas como distribuidora, deve disputar margens com concorrentes privados. Mas se avançar para a venda direta ao consumidor, com frota própria e pontos de revenda, pode mudar radicalmente o mercado”, disse.
Edifício-sede da Petrobras, no centro do Rio — Foto: Marcos Serra Lima/g1